Como os Episódios V, VI e VII explicam o Luke do Episódio VIII?

O Luke Skywalker de Os Últimos Jedi não é o mesmo de O Retorno de Jedi. Nem é o mesmo do antigo Universo Expandido Legends. mas ele deixa de ser Luke Skywalker? Siga-nos nessa análise dos roteiros dos Episódios V, VI e VII para entender esse velho rabugento do VIII!

Deveria ser óbvio, mas… SPOILERS!

Nós aqui gostamos muito desse texto, ele tem uma análise do ponto de vista do crescimento do personagem, tomando como base os Episódio V e VII, com pitadas do VI, para explicar como o Luke do Episódio VIII faz sentido. Esperamos que torne a sua próxima vez de ver o filme uma nova experiência – independente se você gostou ou não do que viu:

Artigo original: Luke Skywalker’s Arc in ‘Star Wars: The Last Jedi’ – Big Shinny Robot

Por: Bryan Young

Traduzido por: Jair Yoda

Revejo The Empire Strikes Back e eu acho que é evidente que não havia outra escolha para Luke Skywalker em The Last Jedi, dados os eventos de The Force Awakens. Toda a premissa de The Empire Strikes Back é que Luke Skywalker pode sentir Han e Leia em perigo antes de acontecer do outro lado da galáxia e larga tudo para salvá-los.

O que faz a maior pergunta em The Force Awakens, para mim, “Por que Luke não salvou Han?”. Não é Snoke, nem os pais de Rey, nada do tipo. Por que Luke Skywalker deixou Han Solo morrer?

A maior pergunta do Episódio VII não é Snoke, nem os pais de Rey: Por que Luke Skywalker deixou Han Solo morrer?

Luke é o mistério central de The Force Awakens. A frase inicial do letreiro é “Luke Skywalker desapareceu”. A cena de fechamento foi que Rey o encontrou. O filme está implorando-nos para fazer essas perguntas sobre Luke. Por que nos deixamos ser desviados por Snoke e pelos pais de Rey?

Por causa de Empire e The Force Awakens, não creio que Rian Johnson poderia ter feito qualquer outra coisa com Luke Skywalker e ter feito sentido. Havia pequenas variações que poderiam ter sido feitas, com certeza, mas os grandes golpes do que Johnson nos deu são praticamente inevitáveis. Eu esperava que Luke jogasse o sabre na primeira vez que eu vi o filme. Esse é o problema dele. Eu estava no vagão do “Luke está se voltando para o movimento não-violência” por um tempo. Mas fiquei furioso a primeira vez que o ouvi dizer: “Onde está Han?” COMO ASSIM? Eu percebi que tinha que haver uma razão para isso … Minha paciência valeu para o que eu acho um dos momentos mais sinceros e impressionantes do filme: quando Rey percebe que Luke se cortou da Força. [Nota do tradutor: Rey fala isso no final da cena de meditação dela, onde ela fala que não sentiu a Força vindo dela e conclui que ele se cortou da Força.]

Aqui temos o usuário mais poderoso da Força na galáxia forçado a se cortar de todo o instinto que ele tem por temer que ele fará a galáxia mais mal do que o bem. Do ponto de vista de Luke, essa abstinência da Força é heroica. Outro expurgo Jedi torna-se impossível. A perspectiva do público não tem sido tão simpatizante. Mas este também é um dos temas centrais de The Last Jedi: que todos nós podemos perceber o mesmo exatamente de uma maneira diferente.

Não estou apenas falando sobre a sequência de Rashomon (o que pensei que era um filme brilhante), mas a visão de Rey e Kylo compartilhava e discutiram sobre no elevador. Eles viram o mesmo e chegaram a conclusões diferentes sobre o que seria esse resultado. [Nota do tradutor: Eu não notei na primeira vez que vi o filme, apenas na segunda, mas ambos viram a cena de luta dos dois contra os guardas pretorianos e enquanto Rey concluiu que Ben Solo voltaria para a luz, Kylo concluiu que Rey iria para o lado negro. E eles comentam isso no elevador, um dizendo que viu o futuro do outro.]

“Sempre em movimento é o futuro”, dizia o mestre Yoda.

Mas vamos falar sobre a sequência de Rashomon. Porque, para mim, é isso que fez Luke o MENOS Luke e o MAIS do Luke e quanto mais eu assisti-lo, mais me corta o coração das melhores maneiras. No caso de alguém não ser familiar, Rashomon é um filme inovador de samurai de 1950, de Akira Kurosawa, que sempre foi uma influência intensa de Star Wars. Ele conta o conto de um assassinato em um prado de três perspectivas diferentes. O filme nunca nos oferece uma verdade objetiva sobre o que aconteceu, simplesmente permite que os narradores sejam tão confiáveis ​​ou não confiáveis ​​quanto o nosso ponto de vista permitir.

Rashomon de Akira Kurosawa é a inspiração para as três versões de uma noite: Como Luke queria, como Kylo entendeu e como foi.

Nosso primeiro vislumbre do tríptico “Rashomon” em The Last Jedi vem quando Luke explica que ele sentiu o lado negro em Ben. Ele foi confrontá-lo sobre isso e isso não ocorreu bem. Nenhum sbre estava em jogo. É assim que Luke DESEJA que teria ido, acima de tudo. A segunda versão é da perspectiva de Ben. Naturalmente, ele é o herói desta versão. Luke praticamente tem os olhos de Sith e seu sabre-de-luz verde é quase um amarelo doentio. Do ponto de vista de Ben, Luke absolutamente chega para assassiná-lo . Não há dúvida em sua mente. E então, pela terceira vez, recebemos a versão de Luke. Uma mistura dos dois com muitas máscaras de cinza. E, pelo meu dinheiro, a versão da história que eu acredito. E é o que penso mais verdadeiro para o personagem de Luke.

Luke vai verificar Ben e a escuridão que cresce dentro dele. Esta checagem de bem-estar já é cheia de auto-dúvida. Luke, como toda pessoa criativa ou heroica que já conheci, sofre de síndrome de impostor. Assim como a de Obi-Wan. [Nota do tradutor: Síndrome de impostor é uma síndrome em que, não importando o nível de sucesso alcançado em sua área de estudo ou trabalho, ou quaisquer que sejam as provas externas de suas competências, as pessoas ficam convencidas de que não merecem o sucesso alcançado e que de fato são nada menos do que fraudes. Existem estudos mostrando que ela é comum em níveis acadêmicos de mestrado e doutorado. 70% das pessoas passarão por isso ao menos uma vez na vida.]

E aqui ele vê uma escuridão maior do que qualquer coisa que ele poderia ter imaginado. E um futuro em que todos os seus entes queridos são mortos e a ordem Jedi com que ele se importou queimando no chão. O que aconteceu a última vez que ele foi confrontado com uma imagem dessas? Na última vez que aconteceu, ele estava no salão do trono do Estrela da Morte [em Return of the Jedi] e Vader provocou-o com essa visão do futuro e ele perdeu o controle. Ele acendeu o sabre-de-luz instintivamente e lutou. Com fúria e raiva. Mas ele se afastou de fazer o que ele jurou que não faria: matar seu próprio pai. Então, ele lança seu sabre-de-luz e diz, essencialmente: “me mate se você precisar, mas morrerei como um Jedi”.

Agora, ele vai para a cabana de Ben e vê esse futuro novamente. E, como antes, seu sabre acende-se. E isso é surpreendente para ele. Ele está instantaneamente envergonhado de si mesmo e deve lidar com a conseqüência dessa consideração feita em uma fração de segundo. Nós sabemos que ele NUNCA matará seu sobrinho. Ben não. Alguns disseram que Luke não consideraria isso de novo, mas enfrentar o lado negro de si mesmo não é “uma vez e está acabando”. É uma constante. Nós aprendemos e nós crescemos e nós constantemente temos que reavaliar isso.

E aqui é onde Luke decidiu que era finalmente a coisa certa para a galáxia acabar com os Jedi e sair da Força. Porque esses ciclos de violência acontecerão entre o bem e o mal, lutando pelo poder. E a constante, na visão de Luke, era os Jedi. [Nota do tradutor: essa visão já foi a motivação de vários personagens, Jedi ou não, no antigo Universo Expandido Legends.]

O fracasso deles. A hipocrisia. A arrogância. Se eles estivessem fora do campo de jogo, não haveria Vader. Ou Kylo Ren. Então, em vez de voltar e treinar NOVOS Jedi para derrubar seu sobrinho, ele simplesmente termina o ciclo. Violência gera violência e Luke não participaria mais.

No duelo final, Luke pode manter a sua filosofia de não-violência e ainda inflamar a galáxia com sua lenda.

E é por isso que adoro o fim do filme. Luke finalmente aprendeu com seus erros. Ele poderia manter a sua não-violência, mas ainda deu um exemplo que iria inflamar a galáxia. É por isso que seu sabre nunca toca Ben durante a luta. É uma 100% uma evasão. Ele perdeu a compreensão do valor da lenda de Luke Skywalker, mas Rey o ajudou a encontrar essa compreensão novamente. E ele poderia novamente acreditar em si mesmo. E nos Jedi.

Na minha perspectiva, dada a falta de ação de Luke em The Force Awakens, esta é a ÚNICA coisa que poderia ter sido feita com ele. E por isso que abracei tanto o arco. Eu amo isso. Você não precisa gostar, mas este é o Luke que eu vi lá em cima. E quando ele tem seu momento heroico em Crait e no pôr-do-sol binário … É uma obra perfeita para seu personagem, dada a volta que o universo e o cânone deram.

12 comentários

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    • Alexandre Henrique em 10 de janeiro de 2018 às 12:52
    • Responder

    Perfeito! Os haters quebraram a cara, achando que iriam ver um Luke nos moldes do Starkiller, do The Force Unleashed… mero engano! Ele simplesmente amplificou a palavra Jedi nesse filme! Simplesmente incrível!

    • DeCocco em 10 de janeiro de 2018 às 12:56
    • Responder

    Eu realmente lamento que alguns fãs ardorosos e outros antigos não tenham gostado do arco do Luke no filme. Como eu apreciei ter assistido aquelas cenas no cinema.

    • Rob Son em 10 de janeiro de 2018 às 13:14
    • Responder

    Concordo plenamente com tudo. Infelizmente alguns fãs querem só ver pancadaria e personagens “fodões”. Personagens com profundidade e que precisam de reflexão deixaram de ser interessante por essas pessoas.

      • Bruno Praça em 10 de janeiro de 2018 às 19:52
      • Responder

      Antes do filme sair boa parte dos fãs estavam muito mais interessados em ver um Luke “badass” e saber o “nível de poder” dele (eu vi muito disso no facebook) do que interessados no personagem em si.

    • Tainã Campos em 10 de janeiro de 2018 às 16:30
    • Responder

    Aquele Luke da trilogia classica pressente que o universo vai ser ameaçado por uma força maléfica e acha de bom tom passar o resto da vida enclausurado enquanto as pessoas que ele ama vão com toda certeza enfrentar essa tal ameaça e morrer pra defender o que ELE sempre acreditou? Até aceitaria um Luke depressivo e diferente daquele herói clássico de sempre, mas um Luke que vai contra pelo menos 80% de tudo o que foi mostrado do personagem somente pra pregar um discurso brega de “não violência” em uma franquia que se chama GUERRA nas estrelas acho que foi forçar demais a barra. O politicamente correto tá acabando com o cinema mesmo.

      • Tainã Campos em 10 de janeiro de 2018 às 16:33
      • Responder

      Seria de bom tom ele se fechar para a força e deixar o passado Jedi dele pra trás nesse sentido, mas jamais deixar de lutar do lado da irmã dele, nem que fosse como um piloto ou general.

      1. Se Luke estivesse lutando pela resistência, só a presença dele ali, iria atrair a atenção de mais mal para a resistência e, consequentemente, sua irmã. As pessoas iam olhar pra ele e não iriam ver o General Luke, ou o Piloto Luke, as pessoas iam ver o Fucking Mestre Jedi Luke Skywalker. A melhor decisão dele, para proteger seus entes queridos, era realmente sumir.

    • Iury Rezende em 10 de janeiro de 2018 às 20:38
    • Responder

    Fiz esta critica ao filma:
    “O último Jedi” (2017) é o título do episódio VIII da saga iniciada por George Lucas no ano de 1977 em “Star Wars, Uma Nova Esperança”, criação cinematográfica mais cultuada pelos fãs do gênero Fantasia, sci-fi e aventura da história do cinema mundial. George Lucas revelou que a saga seria um projeto de nove filmes, em três gerações distintas, iniciada pelo episódio IV, que conta às aventuras do herói Luke Skywalker, Princesa Lea, o pícaro e carismático contrabandista Hans Solo, além do super-vilão Darth Vader.
    Lucas tinha intenção de homenagear os seriados de matinê que assistiu, como complemento das sessões principais nos cinemas, como: Fash Gordon e Buck Rogers, além de incorporar personagens do filme A Fortaleza Escondida (1958), de Akira Kurosawa. Outros filmes foram fontes de ideias, como no clássico Metrópolis (1928) de Fritz Lang, adaptando as formas da androide Maria ao robot C3PO. Já o documentário alemão “O Triunfo da Vontade”, dirigido pela cineasta Leni Riefenstahl, registrou um congresso do partido Nazista com estética neoclássica e serviu de inspiração para ornamentar o universo Sith e do Império.
    O Antropólogo Joseph Campbell encontrou paralelos em sua obra “O Poder do Mito” na saga de Star Wars, principalmente pela construção dos personagens de Luke Skywalker e seu arco dramático, como a do Herói-vilão Hans Solo. Este embasamento estrutural colaborou para que Star Wars alcançasse voos mais altos do que apenas uma série de entretenimento. Também é um fenômeno da cultura pop com raízes mais profundas na psicologia dos arquétipos, em forma de fábula moderna, ao discutir o clássico tema da luta do bem contra o mal. Encontramos também elementos da filosofia holística e oriental, sem ser maniqueísta, revelando personagens que transitam entre o bem e o mal, influenciado por forças da natureza cósmica. Estes conceitos foram explorados principalmente nos dois filmes seguintes da saga: O Império Contra-ataca e o Retorno do Jedi, nos embates entre os personagens de Luke Skywalker e Darth Vader e suas alternâncias entre a “Força”, como no duelo do Yin e Yan e referências Freudianas como na obra: “Totem e Tabu”.
    A série foi retomada por George Lucas nos anos 2000, mas sem o brilho da trilogia inicial, empalidecendo a saga, que conta a origem dos personagens Darth Vader, Obi Wan Kenobi e procurou dar mais esclarecimentos sobre as ordem dos Siht e Jedi. Infelizmente Lucas decepcionou os fãs com uma trilogia bem abaixo do original, mergulhando o projeto de realizar os segmentos finais no esquecimento. Após a Disney comprar os direitos da franquia de Star Wars a série foi retomada nas mãos do novo Merlin do cinema fantasia, J. J. Abrams, que dirigiu e escreveu o episódio VII: “Star Wars, O despertar da Força” em 2015, além de se tornar o produtor da derradeira trilogia, juntamente com Kathlenn Kennedy.
    Voltemos ao filme em questão que é “O Último Jedi”(2017), dirigido pelo talentoso diretor e escritor Rian Johnson, autor de diversos episódios da cultuada série “Breaking Dead”(2008-13). Rian foi a escolha mais correta por transformar o episódio VIII em uma grata surpresa. Seu background em Breaking Bad, em lidar com um personagem bipartido como “Walter White/Heisenberg”, que durante a série transita em entre o bem e o mal, justificado no conhecido “Dilema de Heinz”. Esta construção de Vilão-Herói servira de apoio para os personagens de Luke Skywlaker, a jovem e promissora Jedi, Rey, e o Vilão dividido Kylo Ren, capaz de matar o pai Hans Solo, no episódio VII.
    O episódio VIII começa na cena final do filme anterior, a de Rey entregando o velho sabre de luz ao seu dono que subitamente o joga ao ar, como se fosse um lixo qualquer. Esta cena provoca risos e estranhamento ao desacralizar um momento que seria sublime para todos os fãs da série. Este momento pós-moderno desconstrói o personagem máximo de Star Wars e dá o tom do filme ao surpreender o público com as reviravoltas, humor e desdobramento dos personagens, que são colocados em cheque e passam por transformações. Talvez por este motivo, por ser o filme da saga mais ousado e com mais mudanças, causou uma reação em um grupo de fãs, extremante reacionários. Estes passaram a boicotar e dar pontuações baixíssimas no IMDb e mover uma petição contra a Disney para tirar o filme da série. Uma reação conservadora de fãs que parecem não entender nada de cinema, da saga e da proposta de George Lucas, coautor do roteiro. Infelizmente vivemos em um mundo em que a internet, assim como democratiza, também organiza grupos pró-fascistas, que elegem Trump e apoiam golpes de estado, como aconteceu no Brasil.
    Voltando ao filme, temos o personagem de Rey, que esperançosa em obter um treinamento e liderança da Lenda Jedi, leva um balde de água fria, pela reação de Luke por recusar treina-la e ajudar os rebeldes. Como nas histórias de mestre e aprendiz, o professor acaba cedendo e Rey passa a receber a 1º lição fundamental, a de ter o real contato com a Força, e por um momento é conectada com o lado negro. A partir do 2º dia, Rey passa a sentir a presença de Kylo ao vê-lo e ouvi-lo, telepaticamente. Esta sequencia entre os dois remetem a tentativa do herói em transitar entre dois mundos, como se fosse imune às seduções do lado negro. Kylo a convida para se associar a sua nova Ordem, sem os Jedis e Siths. Já Rey tem esperança que Kylo abandone a 1ª Ordem e se alie aos rebeldes, e talvez, romanticamente como seu parceiro, pois é nítida a atração física. Rey continua o seu treinamento, revelando uma Jedi diferenciada, até o momento que em mais um contato telepático, Kylo convence Rey que Luke tentou matá-lo, quando era seu aluno. Esta revelação chocou Rey que pediu a confirmação de Luke. Ao afirmar que sim, provocou a saída emocionada de Rey da ilha, não dando chances de Luke explicar a verdade completa. A revelação de Kylo foi estratégica para separar Rey de Luke e atraí-la para os seus domínios.
    Ao chegar à nave do Supremo Lider da 1ª Ordem, Snoke, interpretado por Andy Serkis, onde também se encontrava Kylo Ren, Rey é aprisionada e levada para ser interrogada sobre o paradeiro de Luke, considerado com a maior ameaça aos seus domínios. Na Sala do Supremo Líder, em cores de profundo escarlate e negro, associações as cores nazistas, é iniciado o interrogatório/tortura. Uma nova e a mais surpreendente reviravolta. Kylo mata furtivamente o seu mestre e libera Rey, que juntos passam a lutar contra a poderosa guarda imperial dos Sith. Os dois saem vitoriosos e Kylo convida Rey para ficar ao seu lado e construir uma nova ordem, onde não haveria mais Jedis, Siths, rebeldes, seus pais e tio, uma ordem totalitária, capaz de controlar qualquer rebelião. Rey questiona Kylo porque tinha assassinado seu pai e como isto poderia ser justificado para a criação de uma nova ordem. A resposta fria de Kylo é que tinha que ser feito, assim como em Totem e Tabu. Rey nega seu convite e se desvencilha e foge de Kylo e sua nave.
    A minha comparação com a obra ficcional de Freud, Totem e Tabu, ou mesmo com o mito de Édipo, em relação ao arco de Kylo Ren, não é para dizer que o atormentado sobrinho de Luke estava apaixonado pela sua mãe, a princesa Leia, com teria afirmado o pai da psicanálise em sua teoria sexual. Kylo, na verdade, se assemelha a Édipo na comparação dos dois arcos. Não que Hans Solo e Leia exilaram o jovem Kylo, para um planeta longe, em um plano diabólico para ser assassinado pelo seu Tio, mas na cabeça de Ren assim foi fantasiado, a partir do momento que flagrou Luke, armado com seu sabre de luz, na eminência de ataca-lo em seu leito. No mito de Édipo, ele é afastado de seu lar pelo seu pai, o rei Laio, que aconselhado pelo oráculo de Delphos sobre uma profecia de um futuro golpe palaciano liderado por seu filho, e por este motivo, foi pregado pelos pés no Citerão. No ensaio ficcional de Freud, Totem e Tabu, um poderoso e ditatorial chefe tribal, sofre um motim e é assassinado pelos seus filhos, que desejavam o seu poder e as suas esposas. Para Kylo Ren, ao se sentir traído pelos seus pais, que o confiaram ao seu tio, pai espiritual, possível autor de uma tentativa de assassina-lo, foi como dar uma guinada de 180º em sua cabeça, e fornecer um ódio, já alimentado pelo lado negro, se colocou como presa fácil do líder da Nova Ordem de Snoke e do fantasma de seu avó Darth Vader, seu novo pai espiritual. Muito diferente das motivações gratuitas que levaram Anakin Skywalker a abraçar o lado negro, em Episódio III: A Vingança dos Sith, Kylo possui motivos mais vigorosos e relacionados à tradição arquetípica do herói-vilão e ser conduzido ao trágico arco da vingança e do ódio.
    Além do trio principal temos alguns personagens significativos na construção dramática deste episódio, que possui mais reviravoltas, mais cenas de ação, em total estado de ebulição. Destaco principalmente a nossa velha conhecida, Princesa Leia, comandante e líder dos rebeldes, mãe do vilão Kylo Ren, interpretado pela atriz Carrie Fischer, falecida em dezembro de 2016. Leia, escolha certa para liderar os rebeldes, é o contrapeso para balancear as impulsividades do Jovem Major Poe, interpretado pelo ótimo Oscar Isaac, herói em construção, mas explosivo e inconsequente, capaz de arriscar a sua vida e a dos pilotos da esquadra rebelde em uma missão impensada. Assim com Poe, o aspirante a Jedi, Finn, também demonstrou imaturidade, fúria descontrolada e impulsos suicidas, nas cenas de batalha.
    O arquétipo equivocado de herói geralmente esta associado à personalidade de personagens com as de Poe e Finn, arrebatados e capazes de se sacrificarem, mas de forma gratuita e irrefletida. Diferente destes “heróis”, o episódio VIII, apresenta uma heroína, na tradição arquetípica, a Comandante Chefe Amilyn Holdo, encarnada pela atriz Laura Dern, que é ponderada, enérgica e adota sábias decisões. Seu sacrifício não é gratuito, mas eficaz. Leia e Holdo são o equilíbrio e a circunspecção necessários para que o movimento rebelde não esmoreça sob os ataques da 1ª Ordem, apesar de reconhecerem a necessidade da energia e juventude dos “heróis” Poe e Finn.
    Como havia mencionado, o episódio VIII possui o maior número de reviravoltas, tramas paralelas e subjacentes com o objetivo de envolver o público a um jogo de aparências que subvertem as fórmulas de filmes de ação de Hollywood, geralmente previsíveis. Isto é graças ao talento do diretor e escritor Rian Johnson e sua trajetória em filmes como “Looper” e a série “Breaking Bad”. Rian utiliza camadas, em seus roteiros, que são conduzidas e reveladas nos tempos dramáticos e dá uma dinâmica e alteridade aos seus personagens, ricos de profundidade psicológica. Em “O Último Jedi” um personagem significativo é o do contrabandista e Hacker “DJ”, interpretado de forma brilhante por Benicio Del Toro, alternando confiança e desonestidade, ao público e aos personagens rebeldes que o contratam para decriptar a defesa de um destróier a ª Ordem. Em uma cena, quando DJ, Finn e a personagem Rose Tico estão em uma nave roubada de um rico contrabandista de armas, DJ revela que este pirata ganhou fortuna vendendo armas para o Snoke, mas também para a Força Rebelde, para a decepção e surpresa de seus contratadores. Este mundo de aparências é permeado durante toda a trama. Quando Finn e Rose procuram por DJ nos cassinos de um belo planeta, um verdadeiro resort para ricos, Finn se encanta com a beleza e o luxo do lugar. Rose revela que por traz desta beleza, criada e usufruída pelo “1%” e 1ª Ordem, existe a exploração dos “99%” da população, que sofrem de escravidão, miséria e sofrimento para sustenta-la.
    Em outra cena chave, quando Luke Skywalker, desiludido por perder mais um brilhante aluno, resolve botar fogo na biblioteca sagrada Jedi e por fim à “Ordem”. Luke esta vacilando em incendiar o local, acompanhado do curioso espírito do mestre Yoda, quando um raio, em meio à tempestade, cai e fulmina a sagrada biblioteca, desesperando o confuso Herói, que tenta entrar no local em chamas para salvar os livros. Yoda cai em gargalhadas ao assistir seu pupilo atordoado. Luke questiona Yoda o porquê das gargalhadas e Yoda dá uma resposta, claramente inspirado na tradição da filosofia Taoista. Yoda diz que Luke sempre idealizou muito as coisas, sempre contemplando o horizonte. Os livros que tanto preservou e por eles se isolou e se tornou guardião, são com uma efígie gasta. Yoda afirmou que o valor das coisas está bem próximo, mas não são realmente notadas. Por fim, aconselhou Luke a renovar sua aliança com a Força e procurar Rey, a nova esperança. Skywalker, que durante anos, amargou um confinamento na ilha, de um planeta distante de todos, como um monge sem fé, devido a culpa do que tinha acontecido com seu pupilo e sobrinho Kylo Ren, reconhece seu erro e sua cegueira. Novamente é preenchido por um sentimento de equilíbrio e esperança, através dos sábios conselhos de Yoda, e pela própria consciência, que durante o período de ostracismo, sua psique estava confabulando inconscientemente para este retorno.
    Skywalker, neste ponto, retoma a sua trajetória do Herói e ao seu real significado, concluindo um ciclo, como diria Campbell, o monomito.
    O monomito é estruturado em três seções: Partida (às vezes chamada Separação), Iniciação e Retorno.
    A Partida lida com o herói aspirando à sua jornada( Star Wars, A nova Esperança); a Iniciação contém as várias aventuras do herói ao longo de seu caminho(Episódios V e VI); e o Retorno é o momento em que o herói volta a casa com o conhecimento e os poderes que adquiriu ao longo da jornada(Episódio VIII). Isto foi estabelecido por Joseph Campbell na primeira parte de O Herói de Mil Faces, intitulada “A Aventura do Herói”. A tese do autor é de que todos os mitos seguem essa estrutura em algum grau. Para citar vários exemplos, as histórias de Prometeu, Osíris, Buda e Jesus Cristo todas seguem este paradigma.
    Luke tinha adquirido um status de lenda, reforçado pelo seu misterioso desaparecimento. Seu retorno, triunfal e espetacular, se consolidaria no momento que a força rebelde, já sem forças e acuada, em um planeta de sal, pelas forças inimigas, lideradas pelo seu sobrinho Kylo Ren. Skywalker se apresenta sozinho, enfrentando diversos maquinários de guerra na já destruída entrada da base rebelde. Kylo dá um comando absurdo, para que todas as suas naves atirem em seu Tio com força total. Após uma enxurrada de tiros que literalmente sangram o terreno salino, Luke reaparece da montanha de fumaça e fogo, com se nada havia acontecido, emoldurado por uma excelente gag, ao espanar o ombro com uma das mãos. Aliás, o humor, timidamente usado na saga, foi farto e sabiamente utilizado neste episódio, como pontos de alívio, entre as cenas de ação e suspense.
    Voltando a cena, Kylo ao ver que seu exagerado intento foi um fiasco, aceita o convite de seu tio para um duelo de sabres de luz, que transcorre como um dos pontos altos do filme e da saga, comparado somente à clássica cena do duelo entre Vader e Luke em “O Império Contra-ataca”. Novamente o diretor Rian nos surpreende na cena em que Kylo penetra o corpo de Luke com o flamejante sabre de luz. Na cena seguinte o público é informado que Luke, na verdade, esta monitorando um espectro de seu corpo da ilha, por um poderoso e inédito poder, adquirido por alcançar o estágio final de um mestre Jedi, enganando Kylo e a todos em volta. Ao penetrar Luke, Kylo sentenciou uma frase: “Estou acabando de uma só vez com o último Jedi, com os rebeldes, e qualquer tipo de esperança”. Luke o contradiz ao afirmar: Não sou o último Jedi, os rebeldes continuarão a lutar,…, e depois se esvanece. Encontramos Skywalker enfraquecido no alto da ilha, deitado em uma pedra e vislumbrando um por de dois sóis, um olhar contemplativo e romântico, como a do jovem Luke tinha ao mirar um similar por do sol, sonhando com aventuras e outros mundos. O velho Jedi desaparece como um sacrifício consentido, uma espécie de conversão espiritual, ou “renascimento em forma de luz”. Fechando o ciclo do Herói, que a gora será repetido e continuado pela sua pupila Rey.
    Na cena final, Luke que se torna uma verdadeira lenda e fonte de inspiração para todos os 99% da galáxia, uma jovem criança, personagem de uma cena episódica no meio do filme, exibe um anel com o emblema Jedi, que ganhou da rebelde Rose, e um olhar cheio de esperança, mirando as estrelas. Fim, créditos e a suntuosa e épica música de John Willians encerra o que foi para mim o melhor filme da saga Star Wars.
    Iury Salk, 21/12/2017

  1. Excelente análise do Luke, é a mesma visão que eu tenho dele e esse texto só veio engrandecer essa percepção. Parabéns pela tradução Jair.

    • Vinicius Carvalho em 11 de janeiro de 2018 às 17:55
    • Responder

    Muito bom! Talvez seja o episódio mais complexo da saga. Por isso dessa controvérsia em um momento que essa galera só quer ver o “heroismo” e o “vilanismo ” explodindo e destruindo as coisas. Ok, é legal…muito do star wars é visual. Mas quando é demasiado e gratuito fica forçado.
    Quando vi pela primeira vez fiquei apenas decepcionado com a morte de Luke. Mas depois pensando e revendo o filme e ao arco que se levou. Luke ficaria meio deslocado na sequência. Imagina Luke enfrentando os cavaleiros de ren….iria ficar muito desequilibrado….não iria ter aquela dramaticidade do esforço do herói em evoluir kkkkk….Na cena final com Yoda, o velho mestre fala que ele terá que treinar a Rey. Luke faz aquela cara de “ok…tudo bem”…Vamos ver isso no próximo, se ele realmente voltou ou se irá voltar pra terminar seu treinamento.TLJ tem muito detalhes, simbolismos e lições. Mas seus atos irão depender muito de sua sequência.

    • Matt em 24 de janeiro de 2018 às 04:47
    • Responder

    “Como criar novas interpretações espremendo os filmes antigos para chegar a conclusões parciais.”

  2. Caramba! Incrível! Agora eu entendo essa questão e na verdade isso foi muito mais bem-feito do que pensei. Ainda assim, Luke poderia ter tentado falar com o Kylo e explicar o que aconteceu, ou até Anakin poderia ter aparecido para o Kylo e mostrado que ele está errado, ele iria escutar o seu ídolo. Eu ainda não entendo como ele pode se inspirar no avô para ser um Sith, se o próprio avô se arrependeu do que fez e acabou com os Sith! Ainda assim, Os Últimos Jedi, pra mim, foi épico, e uma obra de arte incrível. Na verdade, essa questão do Luke nem chegou a me incomodar, a única coisa que me incomodou nesse filmes em específico foi o fato de que Poe, Finn e Rose causaram indiretamente a morte de vários heróis anônimos da Resistência (quem viu o filme sabe o porquê), sendo que não havia nenhuma necessidade disso, e o pior foi que ninguém sequer pareceu perceber isso e falar sobre isso. Se a Holdo tivesse contado seu plano, talvez tivesse sido diferente, ainda não entendi porque ela não contou, se alguém entendeu, gostaria que me respondesse. Novamente, artigo incrível. Sei que não é original daqui, mas eu nunca teria conhecido se não tivessem trazido pra cá, e as notas do tradutor são muito boas e ajudam bastante a compreensão. Muito obrigado por isso!

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