Estamos a menos de onze meses do Episódio IX. Após oito filmes principais da saga, somente dois Skywalker restaram no universo Star Wars: Leia e seu filho, Ben Solo. Com o falecimento de Carrie Fisher, é certo dizer que o último longa-metragem da trilogia sequel marcará igualmente a despedida de seu personagem, a General Organa. Logo, Kylo Ren desponta como o último Skywalker possuindo chances de levar adiante as tradições de sua família. Todavia, a trama de “O Despertar da Força” (2015) e de “Os Últimos Jedi” (2017) indicam que Kylo está muito distante da redenção, até mesmo quando comparamos ao seu avô, Anakin Skywalker.
Darth Vader em sua trajetória de aprendiz do Imperador cometeu inúmeras atrocidades, sobretudo nas obras encontradas no universo expandido. Os quadrinhos “Darth Vader v1” e “Darth Vader v2” são excelentes demonstrações das crueldades que o Sith realizou contra inimigos dentro e fora do Império. Mesmo assim, o vilão retornou ao lado luminoso com o auxílio de Luke, cumprindo a profecia do Escolhido. As incontáveis mortes e atitudes condenáveis de Vader não foram o suficiente para que abraçasse inteiramente a vertente sombria e eliminasse quem ele fora enquanto Jedi.
Dessa forma, pode parecer que a volta de Kylo Ren à luz é factível, contrariando o que mencionei no primeiro parágrafo. Porém, algumas ações diferenciam as gerações sombrias de Skywalker. Darth Vader realmente eliminou milhares de seres e apoiou o regime tirano de Sidious. Escolhas deploráveis e injustificáveis. Mas, durante certo tempo, o vilão sofreu perante a reflexão de quem ele havia se tornado. Além disso, as constantes lembranças de Padmé e o conflito que lhe cercou ao descobrir seu descendente, Luke Skywalker, comprovam a hesitação de Vader. O Sith não se perdoou pela morte de Amidala, e tanto o antigo UE, quanto o cânone, abordam esta temática. O impacto de Luke no Lorde Sombrio é verificado principalmente em o “Retorno de Jedi” (1983), quando Darth Vader opta por salvar sua cria e abandonar os ensinamentos de Palpatine.
Em contrapartida, Kylo Ren passou por alguns momentos de incerteza, os quais parecem ter acabado. A começar pela cena de “O Despertar da Força”, na qual ele encara o capacete de seu avô, incomodado diante da tentação insistente do lado da luz. Posteriormente, cabe ressaltar a passagem de “Os Últimos Jedi”, aonde Kylo exita e não detona a Raddus, nave que sua mãe, Leia, estava presente. Todas essas ocasiões seriam motivos corroboráveis da redenção de Ben Solo, caso este não tivesse deixado pelo caminho indícios mais significativos sobre quem ele almeja ser pós eventos do Episódio VIII.
Ren, de forma consciente, assassinou o próprio pai em “O Despertar da Força”. Notamos que o ato impiedoso mexeu com o equilíbrio de Kylo, conforme Snoke diz no início de “Os Últimos Jedi”. Entretanto, o jovem Solo não estendeu esse sentimento de culpa e mais tarde também matou o seu mestre, expondo intenções questionáveis de dominar o universo e instaurar uma nova ordem. Ou seja, quando Ben previu que Rey juntaria-se ao seu lado, ele imaginava que enfim se libertaria dos velhos costumes (Jedi, Sith, Rebelião, Império, Primeira Ordem) e governaria tudo e todos. Assim sendo, infere-se que Kylo Ren não estava mais preocupado com a sua mãe e quem quer que fosse. Essa situação fica evidente ao final do filme, precisamente na Batalha de Crait. Ao confrontar Luke, Kylo desfere palavras que sugerem que o mestre dos Cavaleiros de Ren aceitou o lado sombrio e está determinado a agir com o intuito de destruir quaisquer vestígios do passado:
Rey – Kylo disse, pronunciando o nome dela como se fosse veneno. – A sua escolhida. Escolhida em vez de mim. Ela se alinhou com as velhas maneiras que têm de morrer. Chega de Mestres. Vou destruí-la, vou destruir você e tudo o mais. Saiba disso.
Percebendo que Kylo está distante do salvamento, concluí-se que o Episódio IX possui boas chances de ser o fim dos Skywalker. J.J Abrams e Kathleen Kennedy reforçaram o raciocínio exposto acima ao darem pistas que de fato o nono capítulo da saga deve acabar com a linhagem de Shmi, Anakin, Luke, Leia e Ben. Tendo isso em vista, finalmente posso introduzir a pergunta que nomeia a publicação: Star Wars depende dos Skywalker?
A indagação é importante porque ao longo de quarenta anos, todos os filmes da linha clássica tiveram os Skywalker em evidência. A trilogia sequel começou a mudar um pouco isso a partir dos personagens de Rey, Finn e Poe. Contudo, Kylo Ren, Leia e Luke também desempenham papéis de destaque nas obras e continuam influenciando a trama com o legado de sua família. Portanto, imaginar Star Wars sem um representante dos Skywalker aparenta ser estranho a princípio. ‘Star Wars’ e ‘Os Skywalker’ parecem se misturar, de modo que ao nosso julgamento, sejam homogêneos. Entretanto, tentarei expor adiante que a franquia é independente, e dispõem de recursos para prosseguir mesmo que a linhagem Skywalker termine.
Enredos além dos Skywalker
A trilogia prequel concentrou boa parte dos seus esforços em narrar o caminho de Anakin até o lado sombrio, enquanto os filmes percursores nos apresentaram Luke e Leia, bem como a redenção de Vader. Obviamente tivemos outros personagens marcantes, a exemplo de Han Solo, Obi-Wan e Chewie, mas o foco da história sempre esteve embutido nos Skywalker. Se hoje milhares de pessoas apreciam Star Wars, precisamos admitir que Luke, Leia, Anakin, e Kylo Ren para as novas gerações possuem uma enorme contribuição nisto. Porém, mesmo com esses protagonistas e antagonistas Skywalker sendo a base de tudo, outros elementos inseridos com tal característica nos longa-metragens fazem a criação de George Lucas ter um vasto potencial: a Força e a dualidade (lado luminoso x lado sombrio, Jedi vs Sith, Império vs Rebeldes, Resistência x Primeira Ordem, etc).
O confronto entre dois lados, abordagem que manifesta-se em diversas obras da cultura pop, permitiu e continua permitindo que o universo de Star Wars se expanda. O dualismo é uma questão antiga, talvez até com maior significado quando a saga surgiu. Todavia, essa temática fez com que os Jedi e os Sith ganhassem uma ênfase a parte dos Skywalker. Adicionalmente, o embate do lado luminoso e sombrio demonstrou estar além da trajetória particular de Anakin, Luke, Leia e Ben, e que portanto revela que Star Wars possui um escopo gigantesco a ser explorado. Creio que a Força se enquadre no mesmo cenário, rodeada de mistérios e instigando os fãs a pensar sobre suas particularidades místicas e científicas.
Admitindo que Star Wars contém recursos identificadores próprios não relacionados aos Skywalker, há a possibilidade de recorrermos à outras histórias da saga que possuem nenhum ou pouco envolvimento desta família, mas mesmo assim conseguem entregar narrativas de qualidade e com “a cara” do universo introduzido em 1977. Aliás, o aparecimento de enredos de Star Wars nas mídias alternativas, seja no velho ou atual cânon, e a sua continuidade por tantos anos são também bons indicativos que a franquia possui alta demanda quanto à tramas inéditas e sem necessariamente ter a participação de Skywalker’s.
Sem mais delongas, gostaria de apontar e discorrer sobre algumas das boas histórias Star Wars que existem no antigo UE e no cânone vigente, as quais fortificam a independência da franquia no tocante aos Skywalker.
Dawn of the Jedi
Série de quadrinhos pertencentes ao Legends, “Dawn of the Jedi” (2012) foi um dos últimos materiais lançados antes da Lucasfilm dar um reboot quase que por completo em SW. Inclusive, o primeiro arco da história – Force Storm – recebeu uma resenha no site. Ainda que DOTJ não tenha qualquer tipo de vínculo com os Skywalker, afinal a HQ está posicionada cerca de 26.000 anos no passado (25,793 BBY), a trama é recheada de personagens marcantes e trata de assuntos relevantes, a citar as origens da Ordem Jedi, dos lightsabers e do conflito entre as vertentes sombria e luminosa.
Star Wars Rebels
Depois de quatro temporadas, a série animada Star Wars Rebels chegou ao seu fim em 2018. Lotada de pontos positivos, como a conexão entre os períodos da trilogia prequel e clássica, a principal virtude do desenho é a originalidade de seus protagonistas. Kanan, Ezra Bridger, Sabine Wren, Zeb, Chopper, Hera e tantos outros tiveram um desenvolvimento magnífico, evoluindo a cada episódio de forma que muitos fãs passaram a admirar a animação, que a princípio sofreu com o hate do público de “The Clone Wars” (2008). Dave Filoni e a sua equipe abordaram a Força de um jeito jamais antes visto, além de terem amarrado com maestria a formação da Aliança Rebelde. Sem dúvida alguma, Rebels é um dos melhores exemplos de que Star Wars sobrevive, e muito bem, sem os Skywalker.
Rogue One: Uma História Star Wars
Primeiro spin-off da saga nos cinemas, “Rogue One” (2016) é considerado por vários integrantes do fandom como o melhor filme da nova era cinematográfica comandada pela Lucasfilm. Particularmente, concordo com esse julgamento. O longa-metragem, devido a razões cronológicas, não teve ao seu dispor os Jedi, e consequentemente o duelo entre luz e trevas, Jedi e Sith, ficou ausente. Contudo, o embate dos mocinhos, no caso os rebeldes, com os vilões, o temido Império Galático, ganhou uma expressividade admirável. Digo isso porque a história de R1, que a propósito conectou-se bem à “Uma Nova Esperança” (1977), no decorrer de toda a sua duração foi contagiante, dando destaque a personagens comuns da Rebelião. Estou de acordo, igualmente, que Darth Vader ajudou a impulsionar a obra, fator que não minimiza os quesitos prevalecentes do enredo: a jornada pessoal de Jyn, a Batalha de Scarif, a visão crítica perante a Aliança, a presença constante da Força, etc.
Darth Bane (Trilogia)
Escrita por Drew Karpyshyn, a trilogia Darth Bane, composta pelos livros “Caminho de Destruição” (2006), “Regra de Dois” (2007) e “Dinastia do Mal” (2009), apresenta uma narrativa importantíssima ao Legends de Star Wars e com influências refletidas ainda no cânone. Tão amedrontador quanto Darth Vader, Bane foi o responsável por recuperar as antigas tradições Sith e instaurar mais uma vez a ‘Regra de Dois’, na qual só há um mestre e um aprendiz. A trajetória do vilão, desde a sua infância até se tornar um especialista nos conhecimentos do lado sombrio, não deixa a desejar em qualquer aspecto se comparada à outras histórias Star Wars. Ademais, Darth Zannah, discípula de Darth Bane, possui um crescimento surpreendente de sua personalidade e poderes, enriquecendo a trilogia. Novamente, sem os Skywalker.
Star Wars: Tales of the Jedi
Quadrinhos situados na era da Velha República, TotJ (1993-1998) é outra amostra formidável do Legends com a ausência dos Skywalker. A série foi composta pelos arcos “The Golden Age of the Sith” (1996-1997), “The Fall of the Sith Empire” (1997-1998), “Ulic Qel-Droma and the Beast Wars of Onderon” (1993), “The Saga of Nomi Sunrider” (1993-1994), “The Freedon Nadd Uprising” (1994), “Dark Lords of the Sith” (1994-1995), “The Sith War” (1995-1996) e “Redemption” (1998). Como puderam notar, inúmeras HQs formam essa coleção de contos, que iniciam pelos primórdios dos Sith até o épico fechamento dos personagens Ulic, Nomi e Exar Kun em “The Sith War”. As histórias passam por reviravoltas interessantes e lidam bem com a tentação dos Jedi ao lado sombrio.
O futuro de Star Wars
Certo, analisamos que mesmo os Skywalker tendo um legado imprescindível em Star Wars, a saga está além da linhagem de Shmi e já apresentou ótimos enredos sem a sua presença. Entretanto, ao examinar o antigo universo expandido, as histórias pós “Retorno de Jedi” permaneceram com uma forte ligação aos Skywalker. Diga-se de passagem, “Star Wars: Legacy” (2006-2010) estrelou Cade Skywalker, parente distante de Luke e Ben Skywalker, como protagonista da série. A família Skywalker no Legends é vasta, conforme a figura abaixo demonstra, ainda que incompleta por não incluir Kol, Nat e Cade Skywalker, e as descendentes Solo, Ania e Allana.
Por sua vez, o cânone parece seguir um caminho oposto, tendo em vista que Leia e Kylo Ren são os últimos Skywalker remanescentes, e de acordo com o que discutimos, estão próximos de seu fim no Episódio IX. Algo, que no meu ponto de vista, é extremamente positivo. A geração Skywalker pode ser muito boa, desfrutando de personagens sublimes. O antigo universo expandido, em particular, comprova isso. Mas o fato de Star Wars no geral estar em um outro patamar, independente de qualquer Skywalker, abre portas para que os futuros roteiristas e criadores não precisem se preocupar em sempre ter que lidar com o passado destes protagonistas. Os fãs serão brindados com heróis e histórias totalmente desconhecidos.
Rey e eventualmente o surgimento de uma nova Ordem Jedi, e/ou os mistérios contidos nas Regiões Desconhecidas, são bons caminhos que Star Wars pode seguir após o final da trilogia sequel. E, para surpresa de alguns, não precisarão de um Skywalker no centro de tudo.