A trancos e barrancos, Star Wars: The Acolyte chegou ao seu fim depois de 8 episódios semanais distribuídos pelo Disney+ que certamente causaram uma reação exagerada entre o público. Sob as mãos de Leslye Headland, essa série contou com 4 diretores diferentes, dentre eles Kogonada, Alex Garcia Lopez, Hanelle M. Cupper e a própria Leslye Headland. Todo esse elenco por trás das câmeras, incluindo também a equipe de roteiristas, cinematografia, figurino, design de produção e outros departamentos já carregavam um currículo bem chamativo com trabalhos amplamente elogiados pela crítica, dignos até de premiações. Sendo uma das séries mais esperadas pelos fãs, The Acolyte foi uma surpresa – tanto positiva quanto negativa.
Positiva por ser a primeira tentativa de abordar uma época inexplorada de Star Wars, saindo da fase Skywalker e Império, e ousada por trazer ideias maduras para o universo, mas negativa por uma reação completamente fora do comum. Com essa onda de conservadorismo entre o público nerd, termos como cultura woke e lacração foram muitos usados para descrever os problemas de The Acolyte, impedindo as pessoas de julgá-la como realmente é: um produto audiovisual com falhas na execução que não se referem ao elenco protagonista escolhido. Dito isso, vale lembrar que esse texto não vai usar isso como base argumentativa de maneira alguma (fala sério, né?), assim como não será abordado tão profundamente a era da Alta República aqui, visto que The Acolyte teve liberdade para construir uma história nova sem precisar de nenhum repertório extra.
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Leslye Headland há tempos demonstrava interesse em trabalhar com Star Wars e, quando aconteceu o anúncio de The Acolyte, a obra foi vendida como a primeira história focada nos vilões e no lado sombrio. Bem, realmente é focada nos vilões e no lado sombrio, mas não foi do jeito que imaginamos. O universo de Star Wars é dinâmico por se tratar de uma galáxia complexa em história, porém simples em temática. Quando falamos de lado sombrio, estamos literalmente falando de personagens que atuam como uma força maligna e agem de forma egoísta, inescrupulosa e ambiciosa. Contudo, por algum motivos, a Disney resolveu trazer questões mais reflexivas em Star Wars como uma maneira de tornar o produto um pouco mais… “maduro”.
Falando propriamente de The Acolyte, a série aborda uma mistura de estilos das sequels (episódios VIII e IX) com aquela pitadinha gostosa de prequels (episódios I, II e III), se adequando a uma época onde os Jedi estavam no seu auge, tanto de poder quanto de arrogância. The Acolyte trouxe ideias grandiosas e buscou seguir caminhos diferentes do comum, mas ao passo que tem ousadia para trazer novos conceitos, também carece de coragem para abraçar essas escolhas e seguir com elas até o fim.
Sua proposta era de abordar o lado sombrio e cumpriu a sua missão: demonstrando uma visão subjetiva do lado sombrio, internalizada nas escolhas errôneas dos Jedi, posicionando-os como vilões. Se a ideia era subverter a visão salvadora de uma camada social problemática, The Acolyte consegue amarrar suas pontas num enredo de mistério envolvendo as gêmeas Osha e Mae (Amandla Stenberg) que perdem sua família depois de uma falha grotesca de um grupo de Jedi. A questão permeia é a expectativa do público de que existiria, de fato, usuários do lado sombrio; o que eu volto na reflexão: será que Star Wars não está se perdendo nessa busca constante por acinzentar a saga?
Essa reflexão pode ser muito subjetiva no coração de cada espectador, mas The Acolyte nos ofereceram personagens dúbios como Qimir que leva ao pé da letra a sedução do lado sombrio. A série trabalha as nuances entre os dois lados, mostrando como o lado sombrio pode ser tentador por ter a liberdade de expor sentimentos negativos de raiva e ódio. O Estranho, ou Qimir, oferece a oportunidade para Osha treinar sendo ela mesma, com suas falhas e suas emoções. Ao mesmo tempo que ele posa como uma sedução do lado sombrio, não temos essa confirmação propriamente dita. A não ser pela finale que estabelece uma conexão entre Qimir e Darth Plagueis, ele não necessariamente se assume como usuário do lado sombrio, o deixando nesse campo cinza e com a possibilidade de seguir por outros caminhos.
E apesar do Qimir roubar a cena, a Osha é uma personagem problemática. Ela e a Mae compõe o protagonismo de The Acolyte, sendo duas caras da mesma moeda que oscilam entre o bem e o mal. A questão é que a série falha em aprofundar as duas meninas, transformando-as em personagens ocas e desinteressantes. Mesmo que a revelação final da natureza das duas irmãs exponha que elas são partes de uma única pessoa, a série teve dificuldade de moldar essas características entre elas.
O personagem Sol, interpretado por Lee Jung-Jae, foi a melhor aquisição para a franquia. É Sol quem move a trama, suas escolhas repercutem através dos episódios e a série não aconteceria se não fosse por ele. Enquanto isso, temos outras figuras carismáticas como Yord e Jecki que, surpreendentemente, não chegam até o final. Aliás, destaco esse ponto: se livrar de personagens cativantes é um passo muito grande.
Propaganda anti-Jedi e pró-Sith realizada com sucesso
Pouco a pouco, The Acolyte mostra que sua verdadeira faceta é a de pôr em cheque todas as problemáticas dos Jedi. É uma crítica acerca do fanatismo de uma ideologia controladora, que se coloca em primeiro plano no julgamento entre o certo e errado. No geral, The Acolyte é carregada de boas intenções na sua temática, o verdadeiro problema cresce na condução de seu enredo e na falta de tato de desenvolver essas escolhas criativas.
Enquanto temos um elenco competente por trás das câmeras, temos um resultado mediano que não condiz com a capacidade da produção. Veja bem, estamos falando de uma série tão cara quanto A Casa do Dragão, mas que não está nem perto em questões técnicas. Estamos falando de cenários mal aproveitados, uma cinematografia lisa, episódios mal editados, diálogos fracos, reflexões rasas… Se existe uma equipe award winner e 10 roteiristas diferentes atrás dessa série, é difícil perceber, pois The Acolyte é um projeto que faltou maturação e desenvolvimento.
É possível se divertir com The Acolyte e suas ideias sem deixar de reparar o vazio em sua direção. Muito disso vem, possivelmente, da duração dos episódios que deixou a desejar. Os 8 episódios tem, em média, trinta minutos, o que foi pouquíssimo tempo para desenvolver todos os plots propostos pela série. Aqui, entramos num campo de “noção”, né? Trinta minutos é equivalente a séries de comédia como Cobra Kai e The Good Place, ou animações como The Clone Wars e X-men 97. Qual é o sentido de aplicar um formato de sitcom para uma série de drama?
The Acolyte se boicotou ao tentar discorrer uma complexa trama em míseros 8 episódios corridos, a conclusão se torna artificial. Para ajudar, a edição de cada capítulo é… complicada. Se temos episódios de respiro como o sexto, onde vemos o desenrolar do enemy to lovers entre Qimir e Osha, temos também uma falta de tato em conseguir abordar uma pegada mais reflexiva e aplicar um romance que faça sentido com sua proposta. Afinal, como a Osha vai se apaixonar por um homem que anteriormente matou seus amigos? Novamente, a ideia é boa (e eu gostei!), mas faltou construir esse romance, um tijolo por vez.
Logo, o ápice de The Acolyte acontece com os episódios agitados, com ritmo e combates de tirar o fôlego. E isso é muito bom! Star Wars é uma saga que não acolhe só os famintos por reflexões profundas e amantes de romances, acolhe também o fã que adora uma boa coreografia de luta. Essa obra se destaca por trazer lutas de sabre muito semelhantes aos da prequels – que tem as melhores cenas de ação da franquia, com uma pitada de cinema chinês e japonês. Que saudade de uma boa luta!
Em suma, The Acolyte é uma experiência divertida, mas não se você pensar demais. É uma obra que buscou ousar em ideias em contraste com o seu desenrolar, que seguiu por uma direção segura e fraca. Todas as suas questões em aberto deixam um sentimento de curiosidade no público em saber qual será o seu futuro, mas, honestamente, para que o seu futuro seja interessante, será preciso muito mais ousadia para a narrativa da Osha, Qimir e Mae; e mais ainda para compor o lado sombrio. Estamos na torcida para que esta história não seja esquecida e que seus elementos possam repercutir pelo universo.
The Acolyte conta com Amandla Stenberg, Lee Jung-Jae, Manny Jacinto, Dafne Keen, Charlie Barnett e Rebecca Henderson no elenco principal. A primeira temporada está disponível no Disney+.
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